sábado, 26 de janeiro de 2013

A GLOBO, AGORA VAI DE EDUARDO CAMPOS.

O jogo de Eduardo Campos, governador de Pernambuco, parecia claro. Enquanto o PT não se definisse, ele continuaria em cima do muro. Sendo Dilma Rousseff a candidata, ele arriscaria entrar na disputa já em 2014. Sendo o ex-presidente Lula, ele brigaria para ser vice, deslocando Michel Temer. Nesta última semana, Dilma obteve sua maior vitória em dois anos de governo, com a redução das tarifas de luz e praticamente se impôs como candidata natural do PT. Coincidência ou não, o deputado Beto Albuquerque (PSB/PE), frequentemente apontado como porta-voz informal de Campos, disse que, agora, o PSB estava livre para tentar seu projeto presidencial.
Se faltava um empurrão, ele veio agora. E partiu da todo-poderosa Globo. Neste fim de semana, a revista Época dedica sua capa (para sssinantes) ao "governador mais popular do País", numa reportagem que espanta pelo tamanho: nada menos que 25 páginas. A chamada, "Quem tem medo dele?", numa semana em que Dilma gerou os principais fatos na política e na economia, certamente alimentará a especulação de que a Globo encontrou seu candidato – uma vez que, no PSDB, Aécio Neves ainda não lançou sua candidatura e José Serra continua criando constrangimentos.
Abaixo, um trecho da reportagem assinada por Luiz Maklouf Carvalho:
O estilo, a trajetória e as ambições de Eduardo Campos, o governador mais popular do país
Quem é o protagonista da política nacional e nome incontrolável nas conversas sobre sucessão presidencial – embora ele insista em negar ser candidato
LUIZ MAKLOUF CARVALHO
Capa da edição 766 de ÉPOCA exclusiva para assinantes (Foto: Leo Caldas/ÉPOCA)
O governador Eduardo Campos, de Pernambuco, é um ótimo piloto de cadeira giratória de rodinhas. Logo ao sentar-se, elegante e espaçoso, já sublinha a que veio. A cadeira é uma das 13 de uma grande mesa preta, em forma de U, na sala de reuniões contígua a seu gabinete. Não terá um minuto de sossego por quase três horas. Campos a manobra para todos os lados possíveis, a esporeia com o ritmo acelerado de sua fluência verbal e, quando a leva, num tiro curto, em direção ao interlocutor, o dorso ainda atlético de 47 anos também assoma, enfático. Seus translúcidos olhos verdes são, surrupiando um autor contemporâneo, como pássaros querendo voar para fora da cara. Campos é, sobretudo, olhos. Na beleza variante da cor, que fisga a atenção, e, principalmente, na mirada, no manejo que lhes sabe dar, ora águia, ora cobra, focados na sedução. “Sedutor” é um recorrente qualificativo até entre adversários regionais – como o senador Humberto Costa, do PT, ou o deputado federal Mendonça Filho, do DEM. Campos sabe que, nos dois casos, o sentido é “cuidado com ele!” – ambos, afinal, são vítimas de peia eleitoral. Mesmo assim, não desgosta.  
Não é o caso quando é chamado de “coronel”, como fez a revista britânica The Economist em reportagem recente, que também registrou seu lado de gestor dinâmico e empreendedor à frente do Estado que governa pela segunda vez, com aprovação recorde – 89% na última pesquisa. Provocado – “O senhor leva mesmo um jeitão de coronel...” –, Campos não esconde o desconforto. Leva a cadeira para a frente e para trás, dá uma brusca freada de general e responde:  
– Isso só acontece quando alguém nasce por aqui. Nunca vi um rótulo desses num político carioca, paulista ou mineiro. Então lamento, porque é uma coisa desqualificando. Que maneira tenho de botar ordem aqui? “É um coronel.” Tá bom. (Falar) é um direito (deles). Fazer o quê?

Entre dez governadores pesquisados pelo Ibope no final do ano passado, Campos obteve a maior aprovação: 34% acham sua gestão “ótima”; 45%, “boa”; 15%, “regular”; 4%,“ruim”; e 3%,“péssima”. É tamanha popularidade que explica por que tantos políticos têm se aproximado dele e que seja impossível discutir a sucessão da presidente Dilma Rousseff sem que seu nome venha à tona. Ele próprio negou, em entrevista publicada por ÉPOCA em dezembro, que pretenda se candidatar à Presidência. Na ocasião, disse que “sem dúvida” apoiaria a reeleição de Dilma. É nessa canoa que os pés de Campos estão, ambos. Antes da eleição municipal de Pernambuco, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava disposto a costurar sua candidatura a vice, já em 2014. Depois que Campos praticamente humilhou o PT, ao lançar candidato próprio à prefeitura do Recife – e vencer –, Lula e Dilma sabem que ficou mais difícil. O desejo de ambos é mantê-lo na canoa para, quem sabe?, um voo solo em 2018. Ser ministro de Dilma reeleita, em Pasta de visibilidade, é uma possibilidade.
Milton Ribeiro,
Mentira. São 45 livros porque 5 receberam dois votos.
Inspirado por Car­los Wil­li­an Lei­te, do Jornal Opção, de Goiânia, o Sul21convidou dez romancistas, poetas, ensaístas ou críticos literários para nomearem as cinco piores obras de autores brasileiros que conhecem. Obviamente, a escolha reflete o gosto pessoal e o conhecimento de cada um dos dez “jurados” e não uma condenação irremediável. Trata-se de uma anti-lista, contrária às listas habituais de melhores.
Ampliando a ideia inicial, pedimos que, a cada voto, fosse acrescentada de uma a cinco linhas justificando a escolha. Por iniciativa nossa, informamos aos votantes que não divulgaríamos seus nomes, postura que foi rechaçada por dois deles, Fernando Monteiro e Ronald Augusto, que têm suas iniciais apontadas logo após seus votos. Os outros “jurados” apenas aceitaram as regras sem comentá-las. Deste modo, não podem receber a imputação de terem planejado agir sob o manto do anonimato…
Por falar em anonimato, o autor desta introdução não votou.
A seguir, então, em ordem alfabética por título, a lista dos 50 livros para morrer antes de ler:
Agosto, de Rubem Fonseca
Tive de ler por obrigação e acabei tomando ojeriza pelo personagem principal do livro: a azia do protagonista.
A Casa do Poeta Trágico, de Carlos Heitor Cony
Romance artificialmente construído, com pretensões de “clima internacional” que termina por criar situações ridículas como a do casal de amantes, personagens centrais, que passam uma noite inteira trepando nas ruínas de Pompeia porque se distraíram (trepando, já) e não perceberam que o sítio arqueológico havia sido aferrolhado, de acordo com o horário de fechamento dos portões (17h). Tudo bem. O homem e a mulher não se incomodam… Sem colchão, sem lençol, sem travesseiro, sem mais nada, continuam a trepar e só vão sair das ruínas quando os funcionários reabrem Pompeia para os turistas, às 10h da manhã seguinte. É mole? Não. Teria que ser muito dura (a noite). Por cenas como essa, melhor morrer antes de ler. (F.M.)
A Casa das Sete Mulheres, de Letícia Wierzchowski
– Essa pérola do cancioneiro gauchesco tem uma das mais mal escritas primeiras páginas da história da literatura universal. O resto do livro vai pelo mesmo caminho.
– Contar a Guerra dos Farrapos a partir das mulheres próximas ao general Bento Gonçalves não é ideia ruim. Mas é tudo canhestro no livro: a narrativa, o enredo, a construção dos personagens. Uma leitura que dura para sempre, no mau sentido.
A Divina Pastora, de Caldre e Fião
Achado um único exemplar num sebo de Montevidéu pelo livreiro Monquelat de Pelotas. Antes nunca o encontrasse!
A Escrava Isaura, de Bernardo Guimarães
Conto de fadas de superação do interdito social. História irrealista que pretendia demonstrar que as tendências (pseudo) democráticas dependiam apenas da boa vontade cristã das pessoas. Daí a Globo ter exibido a novela que tanto agradou a classe média, sempre politicamente equivocada e alienada.
A Guerrilheira, de Índio Vargas
Embora Índio Vargas seja autor de um dos livros mais importantes sobre a ditadura militar, “Guerra é Guerra, dizia o Torturador”, este aqui parece um esboço que alguém mandou inadvertidamente para a gráfica e foi publicado sem passar por revisão. Falta foco, estrutura, cuidado com a prosa, os episódios desmentem uns aos outros, repetem-se, quando não se perdem em digressões que não acrescentam nada, nem tensão.
A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo
– Bobo. A fantasia não dá nem uma novela das seis, o texto é primário. É um crime fazer os adolescentes lerem essa chatice dizendo que se trata de literatura, pior, de um clássico. Esse livro só tem importância dentro da história da literatura brasileira, coisa que o professor pode resumir numa linha e poupar os alunos.
– Clássico absoluto e abominado nas salas de aula brasileiras, mas permanece sendo lido, vendendo e com lugar cativo na alma de cada mau professor deste grande país!
A Quarta Parte do Mundo, de Clovis Bulcão
A orelha promete um “épico eletrizante”, “baseado em fatos reais” (a malfadada passagem de Villegagnon pelo Brasil). Na verdade, “eletrizantes” são as imagens, algumas das mais feias da história da literatura brasileira, como essa: “Uma robusta garça fora ferida e grunhira como um porco”. O autor criou um mundo perigoso, em que os personagens sentem apenas emoções-clichê, como uma “mistura de pavor e ódio”, e em que podem ser “tragados por piratas ou pelos abismos do mar” (tentemos visualizar isso…). Definitivamente não recomendo.
A Suavidade do Vento, de Cristóvão Tezza
Romance fraquíssimo, que nada tem a ver com a sutileza de um Antonioni, em certa tarde, olhando para árvores descabeladamente agitadas: “Como é fotogênico o vento!”, como registrou o mestre italiano da (verdadeira) suavidade na sua “Trilogia da Incomunicabilidade”, bem longe do realismo rastaquera do Tezza desse livro. (F.M.)
As Parceiras, de Lya Luft
Psicologismo mediano misturado com literatura convencional que tenta disfarçar, sem sucesso, um estilo a meio caminho do entretenimento em tom pastel e da autoajuda intimista. Narrativa para lobas fleumáticas. (R.A.)
Bernarda Soledade, a Tigre do Sertão, de Raimundo Carrero
Muito ruim. Influenciado por Lorca (?) até no título, além das situações de “dramaticidade” de estilo juvenil em torno de mulheres confinadas à maneira exatamente de “A Casa de Bernarda Alba” (sem ter, entretanto, conseguido imitar a qualidade do inspirado poeta andaluz). Em tempo: não seria “tigresa”?… (F.M.)
Cai a noite sobre Palomas, de Juremir Machado da Silva
Há uma diferença bastante grande entre construir personagens inteligentes e colocar frases de efeito e nomes de grandes pensadores em suas bocas. Talvez o Juremir não soubesse disso ao escrever o seu primeiro livro. Triste é perceber que segue sem sabê-lo até hoje.
Canto da noite, de Augusto Frederico Schmidt
Para ser justo com o falecido, eu poderia ter mencionado a obra poética inteira como exemplo da pior poesia feita no Brasil. No gênero, o autor talvez tenha sido a maior impostura de todos os tempos. Por ser endinheirado e porque publicava os grandes poetas de seu tempo, era apontado, por eles, como um grande poeta. (R.A.)
Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre
Não é nem romance nem obra sociológica. Até nos faz pensar que no Brasil se praticou e se pratica a democracia racial , via miscigenação e que na casa grande havia senhores bons e na senzala escravos submissos. Cáspite !!!
Contra o Brasil, de Diogo Mainardi
– A história de um picareta que odeia o Brasil e passa o tempo todo citando frases de viajantes e pensadores que desancaram o País e seus habitantes. Acho que ninguém vai querer ler uma autobiografia do Diogo Mainardi, mas por precaução, foi para a lista.
– Mainardi não tem muita preocupação com ideias, propostas, alternativas. Sua intenção é de apenas bater, sua arte é a da objeção. Um livro cuja intenção é a de vender o complexo de vira-latas do autor. Não obtém o riso, não informa, não nada. Merece presença aqui.
Corpo Presente, de João Paulo Cuenca
É um mistério o prestígio que Cuenca desfruta como “autor da nova geração”, já que sua obra parece reunir justamente os piores maneirismos da sua geração: abuso de ironia, pretensão acima da qualidade de seu texto, investimento em fórmulas que já não convencem. Este seu primeiro romance é um bom exemplo: um “romance urbano” com um “protagonista deslocado”, perdido em “questões de sobrevivência e sexo”, redigido em uma “escrita cinematográfica”, que na verdade é uma prosa que se pretende densa e nebulosa, mas apenas abusa de orações coordenadas sem parecer que sabe onde quer chegar. Puxa, como ninguém pensou nisso antes?
Dois Irmãos, de Milton Hatoum
Já houve um Jorge Amado, e foi suficiente.
Estorvo, de Chico Buarque
– O que dizer quando o título diz tudo? Chico, como escritor, costuma, na minha modesta opinião, emular outros escritores, com resultados sempre inferiores aos do original.
– A prova impressa de que a genialidade em determinado campo artístico não implica em qualquer tipo de brilhantismo nos demais. Compositor de raro talento, Chico é um escritor medíocre, infelizmente. Acho que nem fã de carteirinha aguenta esse árido calhamaço de coisa alguma.
Fernando Pessoa, uma quase autobiografia, de José Paulo Cavalcanti Filho
Outro livro enorme, uma biografia excessivamente ocupada do varejo, do trivial-mínimo, da vida pessoal de Fernando Pessoa, que o autor jura ter visto nas ruas de Lisboa (isto é, a alma penada do poeta), talvez sinalizando que ele, Cavalcanti Filho, escrevesse sobre quantas vezes, por exemplo, um bardo alfacinha é capaz de ir ao banheiro, num único dia, depois de ter repetido o fundo prato da caldeirada do “Martinho das Arcadas”… (F.M.)
Harmada, de João Gilberto Noll
Na orelha de Harmada, da Companhia das Letras, Flora Sussekind diz que o “método narrativo característico” de João Gilberto Noll é “o do ‘enfraquecimento’ em moto contínuo do sujeito”. Já se demonstrou, até a saturação, que é possível escrever um romance ou uma novela sem enredo. Mas sem personagem? Chega a ser constrangedor ter de dizer que sem personagem não existe romance ou novela, ou que quanto mais apagado for o personagem, menos romance ou novela temos, o que no fim dá na mesma. Quando digo personagem apagado, quero dizer personagem sem nitidez para nós, leitores. Claro que ele pode ser uma pessoa apagada, como tantas que conhecemos. Mas aí talvez se exija mais agudeza do romancista, já que uma figura mais fugidia, com motivações mais misteriosas, necessita de um texto muito mais preciso. Se o método de João Gilberto Noll é acabar com os personagens, não discuto — deve ter suas razões. Mas seria bom que parassem de chamar o livro dele de romance, confere? Se há uma coisa que me tira do sério são elucubrações críticas para justificar um mau livro. Acho injusto, primeiro, com o autor, que continuará sem base para pensar sua literatura. Segundo, com os leitores que, além de pagarem pelo livro, correm o risco de se sentirem burros por não terem entendido nada ou se chateado mortalmente.
Helena, de Machado de Assis
Êta romancinho chato de início de carreira. Depois, claro, Machado se redimiu.
Ilíada e da Odisseia, de Homero em tradução de Manuel Odorico Mendes
Gongorismo pedante, escrito para um só leitor, o próprio tradutor. Com direitos autorais caducados, virou texto fácil, iludindo leitores e os afastando da melhor literatura de todos os tempos, Homero.
Iracema, de José de Alencar
– Alguém ainda precisa ler um livro que diz que o mar é uma “líquida esmeralda”? Isso era ruim naquele tempo. Hoje é puro kitsch.
– A prosa poética de José de Alencar está morta, mas alguns ainda colocam nossas crianças em contato com ela. Muito mais adequado seria apresentar-lhes a Iracema de Adoniran.
Jonas, o Copromanta, de Patrícia Melo
Este é um exemplo dos perigos da literatice desvairada. Rubem Fonseca escreveu um conto que escapava por muito pouco do inapelável mau gosto, chamado Copromancia, sobre um cara que prevê o futuro pelo desenho formado pelas fezes no vaso sanitário. Quem achava que um argumento literalmente de merda desses se esgotava na vida curta de um conto foi, anos depois, apresentado à glosa do mote: este romance no qual um neurótico arquivista reescreve de modo monomaníaco clássicos da literatura (como a própria autora do livro quer fazer?) e, nos intervalos, prediz o futuro pela posição dos… bem, dos toletes no vaso. Até que o personagem lê o tal conto de Fonseca e se convence de que o escritor recluso roubou sua ideia, passando a persegui-lo. Indecisa entre o pastiche o suspense (até porque o ponto de partida é tão farsesco que é impossível levar o clima a sério), a obra não boia, e sim afunda, para ficar no âmbito temático do romance.
Juca Mulato, de Menotti Del Picchia
Livro de poemas ainda preso ao formalismo perdulário do regime parnasiano e que flerta com a disposição gráfica dos versos livres obedientes a um modernismo de fachada. Temática nacionalista e folclórica, mas sem a radicalidade poética, por exemplo, do poema “Cobra Norato” de Raul Bopp. (R.A.)
Lucíola, de José de Alencar
Embora haja um espaço para José de Alencar na literatura como uma espécie de grande e voraz precursor, esta sua obra, parte do ciclo “urbano” de seu trabalho, é uma das maiores pérolas do humor involuntário na literatura brasileira. A prostituta de bom coração obrigada a corromper-se como arrimo da pura e inocente irmãzinha… Vale por uma cena de putaria light lá no meio, quando Lúcia resolve fazer um strip – ou o que passava por isso no século XIX – em uma reunião social. No demais, corações pulsantes, paixões desvairadas, mortes por doença e um enredo tão improvável que não serve sequer como um retrato acurado da sociedade do período (desculpa, Antonio Cândido, mal aí).
Mad Maria, de Marcio Souza
Uma das piores coisas que pode acontecer com um escritor é sair com um grande livro e nunca mais repetir a dose. Marcio Souza começou com o sensacional Galvez, Imperador do Acre, e nunca mais. “Mad Maria” deve ser o pior dos demais, por ter uma história tão boa pra contar, e não contar.
Manhã Transfigurada, de Luiz Antonio de Assis Brasil
Criar imagens é mesmo uma arte dominada por poucos. É preciso ter noções de decoro, é preciso que as imagens estejam sintonizadas com o “tom” do texto. No entanto, em “Manhã transfigurada”, esse livro em que o cérebro dos personagens parece ter sido misteriosamente sugado por uma força estranha, não encontramos tal cuidado. Não apenas os seios sacodem “como pudins”, como também somos forçados a entrar na cabeça de um personagem que deseja saber se a vagina de uma moça é peluda ou não: “A ideia vagava, e o pensamento obsceno vinha brutal: e as partes do amor, em Camila, como seriam? Polpudas ou lisas, glabras ou velosas? Que cheiro, que odor desprendiam?”. Ai.
Máximas no Twitter, de Demóstenes Torres
Sim, Demóstenes Torres lançou um livro. A partir de tweets. Li parte do conteúdo da “obra” por meio da internet e bem, é tão relevante quanto se poderia imaginar. Cito a “obra” como homenagem a 99% da literatura produzida por políticos em nosso país — toneladas de livros que, somados, não rendem 140 caracteres dignos de leitura.
Mulher de um Homem Só, de Alex Castro
Se fosse um filme, diríamos que há erros de continuidade. Sim, há flagrantes lapsos e não se trata de experimentalismo. Aconteceu  por esquecimento, pressa ou desídia. Não é uma obra absolutamente desprezível, tem duas ou três cenas legais, mas parece faltar-lhe várias páginas, o que lhe fere de morte.
Na margem do rio Piedra eu sentei e chorei, de Paulo Coelho
Neste livro, a literatura de Paulo Coelho surge em todo seu esplendor: rasteira, de linguagem paupérrima, com personagens unidimensionais e uma filosofia profunda como uma poça d’água. Para quem quer “conhecer”, as primeiras 20 páginas são prato cheio – depois, só sendo masoquista.
O Clube dos Anjos, de Luís Fernando Verissimo (Gula)
A editora Objetiva encomendou a grandes nomes da literatura brasileira romances que girassem em torno dos pecados capitais. Verissimo escreveu um livro inapetente sobre a Gula. Eu resumiria assim a questão: serás perdoado pela preguiça se não leres o livro sobre a gula, cujo autor corre sérios riscos de ser punido por aceitar escrever por ganância tamanho abacaxi que serve apenas para despertar a ira.
O dia em que matei meu pai, de Mario Sabino
Complacente exercício de ficção no qual um homem narra a uma psicóloga as circunstâncias que o levaram ao parricídio. É um livro desconjuntado, em que, de uma hora para outra, o relato do paciente à médica é interrompido pela interpolação absolutamente gratuita de noventa páginas de um relato farsesco que pretende ecoar a trama principal, mas apenas consegue cansar o leitor. A voz do narrador, de uma pedanteria artificial e afetada, também não ajuda — oh, lá vem mais um narrador não confiável em narrativa em primeira pessoa… que original.
O Guarani, de José de Alencar
Ainda não entendo por que diabos nossos jovens estudantes são submetidos a semelhante tortura. Se é pelo caráter histórico, melhor ter recuperação no verão de Porto Alegre do que lê-lo. Façam a gurizada ler “Memórias de um Sargento de Milícias” que vão ganhar bem mais.
O Presidente Negro, de Monteiro Lobato
Porque o livro profetizava, entre outras coisas, o seguinte: “…será o choque da raça negra com a branca, quando a primeira, cujo índice de proliferação é maior, alcançar a raça branca e batê-la nas urnas, elegendo um presidente negro!”. Lobato também se referia a um “perigo amarelo” localizado num futuro distante, a obra é de 1926. (R.A.)
O Reino das Cebolas, de Cintia Moscovitch
Uma porcaria total, metido, mal escrito, presunçoso, sem beleza ou trama.
O Romance d`a Pedra do Reino e o Príncipe de Sangue do vai-e-volta, de Ariano Suassuna
Foi sucesso de vendas, quando lançado (no natal de 1971), talvez porque um monte de gente comprou, não leu e presenteou logo em seguida. Estranho: é o mais bem-sucedido – comercialmente falando – livro não-lido da recente história literária brasileira. Porém, ninguém perdeu nada com isso: trata-se de um romance prolixo (“vai-e-volta”, realmente) e super-repetitivo. Pouca gente consegue chegar ao fim desse “tijolo” de letras do entrevistado preferido de Jô Soares, que poderia entrar nesta linha com o seu “O Xangô de Baker Street”. (F.M.)
Olhai os lírios do campo, de Erico Verissimo
História pueril, cheia de clichês, lugares comuns, sentimentos falsos, piedosos, quase tão ruim como Saga.
Os Brasileidas, de Carlos Alberto Nunes
Depois de traduzir Homero, toda a obra de Platão e toda a obra de Shakespeare, precisava verter em versos épicos a saga de Raposo Tavares? Não, jamais!
Ressurreição, de Machado de Assis
Li há dezenas de anos, mas o trauma ficou. Lembro que achei um dos troços mais tediosos que me caíram nas mãos.
Tratado Geral da Reunião Dançante, de Paulo Coimbra Guedes
Nostalgia barata com pretensão de antropologia histórica.
Um Castelo no Pampa, de Luís Antonio de Assis Brasil
Não sei como Assis Brasil, um escritor experiente, no seu nono livro, se permitiu tantos lugares-comuns, coisas do tipo “pérolas de suor”, ou “reinava a amargura”. Eles não podem ser atribuídos à linguagem dos personagens — todos falam igual, sem diferença de idade, sexo, cultura ou posição social, uniformização difícil de explicar. Depois o autor se colocou na velha posição do autor onisciente, aquele que tudo sabe e tudo vê, intensificando a sensação de que ele, Assis Brasil, é quem fala assim. Para completar, há os arcaísmos — não apenas uma incrível preferência por termos em desuso, mas inclusive por construções também antigas. Tem horas que parecemos estar numa dessas traduções lusitanas, onde as pessoas não se aborrecem, não se chateiam, não se entediam, mas se “maçam”. Há montes de personagens, mas não se relacionam, percebem? Têm ódios e simpatias, mas isso é dito assim em seco, como se ódios e simpatias estivessem petrificados, como se não tivessem zonas de sombra e luz, como se não oscilassem, não se modificassem. A gente termina o livro com a impressão de que Assis Brasil pula de um personagem para outro porque simplesmente não sabe o que fazer com nenhum deles.
Um Copo de Cólera, de Raduan Nassar
Recebi o Copo de Cólera do saudoso José Maria Cançado, li e lembro de ter achado que alguma coisa havia de errado com um de nós. Até hoje acho que era com o JMC ou com o livro. Linguagem um tanto ultrapassada, alguma cólera e nenhum copo, que eu lembre.
Um Quarto de Légua em Quadro, de Luís Antônio de Assis Brasil
Ficção histórica didática demais, com um andamento arrastado, sem que os personagens conquistem a simpatia de querermos saber o que lhes acontecerá.
Videiras de Cristal, de Luís Antonio de Assis Brasil
Ao publicar “O pintor de retratos”, Assis Brasil afirmou que se não conseguisse mudar a sua forma de escrever, talvez nunca mais voltasse a publicar um livro. Promessas… Todos os problemas que o velho Assis identificava na obra do jovem Assis estão cristalizados (sorry…) em Videiras de Cristal. Trata-se de um calhamaço de quase 600 páginas, cada uma delas cuidadosamente recheada de frases (igualmente) intermináveis, de diálogos improváveis e de personagens tão pouco críveis que acabaram virando filme nas mãos do inominável Bruno Barreto. Lá encontrarás um tema poderoso, a guerra dos Muckers e a colonização alemã, descrito por meio de platitudes como ‘As almas dos fiéis se assemelham a videiras de cristal: fecundas nos verões luminosos, mas frágeis e quebradiços quando cobertas pela geada do inverno’.
Agradecimento: os livros utilizados na foto de abertura da matéria foram aqueles que encontramos na livraria Beco dos Livros da Gen. Câmara. Somos gratos à Cláudia Maiari, que nos auxiliou e permitiu que desorganizássemos o sebo.

SERÁ QUE SOMOS RACISTAS?


      Anos atrás, Ali Kamel, diretor de jornalismo da Globo, publicou um livro chamado "Não somos racistas", que tinha como objetivo impedir o avanço da política de cotas. Kamel perdeu esse combate e, agora, no próprio Globo, o jornalista Zuenir Ventura demonstra que o Brasil ainda é um país racista. Leia abaixo:
O GLOBO - 26/01
Episódios como o das babás discriminadas em clubes sociais e o da criança negra que foi destratada e quase expulsa de uma concessionária da BMW no Rio demonstram que o racismo, apesar de resolvido legalmente, já que é crime, ainda constitui um problema no dia a dia das relações interpessoais, onde às vezes se manifesta explicitamente. O sociólogo Florestan Fernandes dizia que o brasileiro tem preconceito de ter preconceito. Em outras palavras, o Brasil seria um país com racismo, mas sem racistas, como revela uma pesquisa em que 87% das pessoas entrevistadas afirmaram haver racismo, mas só 4% se confessaram racistas. Muitos alegam que se trata de "racismo cordial" bem diferente do que existe nos EUA, por exemplo. Seria mesmo cordial ou, ao contrário, é velado, camuflado, que quando flagrado se disfarça, alegando engano ou má interpretação?
Na tal loja da Barra, o gerente de vendas viu o menino de 7 anos assistindo a televisão enquanto os pais adotivos, brancos, escolhiam um carro. Sem saber que pertenciam à mesma família, não teve dúvida. Na certa era um moleque de rua que ia pedir dinheiro, incomodar os clientes. "Aqui não é o lugar para você, saia" ordenou. Na nota em que tenta se justificar, a empresa diz que não foi bem assim, que houve por parte do casal "um mal-entendido" Porém, a mãe Priscilla garante que não, que foi um bem entendido gesto de racismo: "Se fosse uma criança branca, ele mandaria sair da loja?"
No facebook, para onde o casal levou seu protesto e lançou a campanha "preconceito racial não é mal-entendido" a reação foi imediata. Cerca de 16 mil internautas se manifestaram com mensagens de apoio. Tomara que a proporção seja essa: que para uma loja que pratica o racismo haja milhares de pessoas contra. Porém, pior ainda do que essas atitudes explícitas, que pelo menos despertam repulsa, é a situação social, econômica e cultural da população não branca no país. Tratadas com naturalidade, as desigualdades raciais no campo da saúde, da educação e do mercado de trabalho são tão iníquas que em alguns casos parecem saídas da novela "Lado a lado" um retrato fiel e competente da luta contra a intolerância racial e religiosa após a abolição da escravatura e no começo da República. Apenas um exemplo: o risco de morte por doenças infecciosas é hoje 43% maior entre as crianças negras com menos de um ano de idade do que entre as brancas. Isso eqüivale a expulsar da cidadania, senão da vida, toda uma geração de negros.
Muitos alegam que se trata de "racismo cordial". Seria mesmo cordial ou, ao contrário, é velado, camuflado, que quando flagrado se disfarça, alegando engano ou má interpretação?